Centro Cultural Brasil-África

A ideia de Comunidade

Localização

Rio de Janeiro, Brasil

Área

5.500 m²

CONCEITO

“O conceito de comunidade perpassa pelo intrínseco e imbricado compartilhamento de ônus e bônus, advindos das relações sociais e emocionais geradoras de “dívidas simbólicas” entre os seus comuns, dispondo-se a estipular horizontes e limites compartilhados em um mundo específico, não necessariamente, conectado por uma faixa contínua de terra”.

O Centro Cultural Brasil-África atua com o símbolo da ponte que conecta culturas hibridas compartilhadas. Atua como resgate histórico reparador que necessita ser constantemente exposto pois faz parte da nossa história. Neste sentido abordar o novo espaço com a ideia de comunidade, ou seja, como sendo um grupo que pode, inclusive, não partilhar de laços geográficos contínuos, mas de histórias entrelaçadas pode ser uma alternativa para o novo museu.

Trazer a noção de comunidade para o projeto resulta em encontrar ações espaciais complexas uma vez que o próprio conceito de comunidade está em constante alteração.  Tal estratégia exige algumas diretrizes projetuais como:

  • Evitar a objetificação de uma arquitetura tipológica, volumetricamente única e arquetípica.
  • Trabalhar na escala da praça frontal e das pessoas que a utilizam, evitando grandes volumes delimitadores da parede virtual deste espaço público e aberto.
  • Não utilizar um único acesso hierarquizada, mas prover várias possibilidades de acesso, conectando as ruas e as docas;
  • Não expressar tectonicamente elementos industrializados que se afastam de uma materialidade mais artesanal;
  • Expressar uma materialidade rica, texturizada, que gere interpretações diversas, que possibilita uma execução in loco e por mão de obra local;
  • Não criar um grande hall centralizador que remete a ideia de controle;

Assim, o projeto aqui exposto busca uma expressão através da técnica construtiva do concreto texturizado e da madeira artesanal. Arcos de diferentes alturas criam uma relação com as praças, criando espaços de variedade espacialidade e intensidade luminosa. A madeira cria um ritmo nas fachadas e uma variação das sombras no espaço interno. Na cobertura a água e um mirante direcionado ao Valongo. Estas premissas levam a um projeto com a seguinte organização:

  1. A praça de mais de 1.000 m² na esquina conecta Docas Dom Pedro, ruínas Valongo e novo museu.
  2. Na cota -3,24 uma segunda praça recebe o visitante. Restaurante e auditório podem funcionar de modo independente, mesmo fora do horário do museu. As paredes escavadas mostram as marcas dos sucessivos aterros. A água aprece como elemento simbólico de uma presença ambiental passada.
  3. No térreo o espaço de exposições temporárias pode se abrir para a praça frontal. Ampliar o acervo, expandir a arte ao espaço público.
  4. No 1° pavimento, em um espaço único, remetendo ao conceito de comunidade, as áreas expositivas e o acervo de registros que funcionam de modo livre, com diversos circuitos possíveis.
  5. Na cobertura os ateliês e o café, envoltos pela água.

Assim, a museu atua como presença construída, mas aberta, compartilha o espaço, as vistas ao entorno, existe com o outro, sendo possível perceber-se na medida em que se descobre pelo olhar de um interlocutor igual. Se relaciona diretamente enquanto fluxos e vistas com os bairros da Saúde, Gamboa, Morro da Conceição, Morro da Providência e Santo Cristo.

O cais do Valongo possui o valor simbólico de testemunho material das raízes africanas nas Américas e se constitui como materialidade condensada em memória viva. O cais está hoje enterrado, é visto de cima, O centro cultural Rio África tem a possibilidade de ser uma elevação, em patamares, expressas em materialidades de diferentes alturas, uma chegada escavada, um térreo com os arcos em concreto, a grande nave expositiva em madeira e o terraço com água. É uma arquitetura que insere novas camadas na rica e complexa história do lugar. Uma arquitetura constituída de tectônicas diversas, pois assim como nos objetos encontrados nas escavações do sítio arqueológico do Valongo, revela uma pluralidade de matrizes africanas e a capacidade dos escravizados em expressar suas marcas identitárias ao mesmo tempo que as reinventavam na situação de cativeiro

A arquitetura proposta busca expressão representativa da militância negra contra a desigualdade social, política, econômica, assim como do ativismo político que luta pelo respeito à diversidade étnica e os direitos humanos mais fundamentais.

Circuito expositivo reflexivo e crítico, sensível e imersivo.

O percurso expositivo se inicia com a temática do Cais do Valongo. Um grande tecido texturizado recebe o visitante. É uma leve referência ao que uniu Brasil e África, o tecido das naus que por mais triste enquanto ação carregada de tragédias, possibilitou o encontro de geografias então distantes pelo Atlântico. O grande tecido receberá filmes, projeções e interações recriando a chegada no Brasil no cais. Será um espaço imersivo e sensitivo. A partir deste o visitante pode ir até a fachada para uma espécie de reflexão e pausa ou pode continuar o trajeto chegando aos espaços com mapas e projeções 3d. Também neste espaço estarão impressos os registros de viagens, números, nomes de mulheres, homens e crianças que chegaram ao Brasil escravizadas. O visitante pode então adentrar a sala Travessia que recria a sensação do interior de um navio negreiro, com imagens, texturas e sons. Após esta imersão de peso, o visitante pode acessar a fachada voltada à praça e ao cais do Valongo. Este espaço possuirá vista livre e na parede aos fundos os registros de nascimento. A sequência expositiva chega até a temática das pessoas, cultura e trabalho. Possuirá uma plataforma central, feita em terra, com bancos em terra batida de onde pode-se visualizar 360° da cultura preta, incluindo música, religião, vestuário, escultura, pinturas, entre outros. O visitante também pode ir até a fachada voltada para o Dom Pedro e visualizar linhas do tempo interativas. Na sequência o visitante chega até a grande maquete do Rio de Janeiro do Século XVIII. A maquete estará apoiada em uma base de terra batida, os painéis ao seu redor reproduziram imagens do que estará sendo visto no modelo tridimensional. Finalizando o percurso expositivo, o visitante adentra o espaço da arte negra contemporânea. Neste espaço delimitado pelas fachadas em toras de madeira (externas), o espaço Terra de Esculturas contemporâneas apoiadas diretamente em um piso terroso para incluir o visitante nesta textura. No restante do espaço, uma parede em terra batida, tipos de pinturas, performance, o corpo, estarão presentes.